Pesquisar este blog

quinta-feira, 24 de março de 2011

A importância das pequenas coisas

Cada dia que passa, percebo a importância das pequenas coisas, gestos, orvalhos, brisas, cheiros, sabores... A complexa máquina que movimenta nossa vida... A complexa vida que movimenta nossa máquina...Não poderia jamais ocultar o sentimento de indignação aos que violam os direitos naturais de simplesmente viver... ou de tirar o brilho do olhar de uma criança... As crianças são símbolos divinos da presença de Deus. Ousar contra elas é desafiá-lo.
Na tarefa de mostrar o mundo aos pequenos, encontramos nossas deficiências... Pois o mundo deles é muito melhor que o nosso... a vida é muito simples... o dia magnificamente lindo... a noite curiosa... Por isso o despertar para o nosso mundo deve ser natural e no ritmo de cada um... Amo a infância, mas principalmente o direito a ela.

Não quero amar,
Não quero ser amado.
Não quero combater,
Não quero ser soldado.

— Quero a delícia de poder sentir as coisas mais simples.
Manuel Bandeira

EDUCAR - Rubem Alves

quarta-feira, 23 de março de 2011

O Patinho Feio

(Hans Christian Andersen)
   A mamãe pata tinha escolhido um lugar ideal para fazer seu ninho: um cantinho bem protegido, no meio da folhagem, perto do rio que contornava o velho castelo.
    Mais adiante estendiam-se o bosque e um lindo jardim florido.
    Naquele lugar sossegado, a pata agora aquecia pacientemente seus ovos. Por fim, após a longa espera, os ovos se abriram um após o outro, e das cascas rompidas surgiram, engraçadinhos e miúdos, os patinhas amarelos que, imediatamente, saltaram do ninho.
   Porém um dos ovos ainda não se abrira; era um ovo grande, e a pata pensou que não o chocara o suficiente.
   Impaciente, deu umas bicadas no ovão e ele começou a se romper.
   No entanto, em vez de um patinho amarelinho saiu uma ave cinzenta e desajeitada. Nem parecia um patinho.
   Para ter certeza de que o recém-nascido era um patinho, e não outra ave, a mãe-pata foi com ele até o rio e o obrigou a mergulhar junto com os outros.
   Quando viu que ele nadava com naturalidade e satisfação, suspirou aliviada. Era só um patinho muito, muito feio.
   Tranqüilizada, levou sua numerosa família para conhecer os outros animais que viviam nos jardins do castelo.
   Todos parabenizaram a pata: a sua ninhada era realmente bonita. Exceto um. O horroroso e desajeitado das penas cinzentas!
   — É grande e sem graça! — falou o peru.
   — Tem um ar abobalhado — comentaram as galinhas.
   O porquinho nada disse, mas grunhiu com ar de desaprovação.
  Nos dias que se seguiram, as coisas pioraram. Todos os bichos, inclusive os patinhos, perseguiam a criaturinha feia.
   A pata, que no princípio defendia aquela sua estranha cria, agora também sentia vergonha e não queria tê-lo em sua companhia.
   O pobre patinho crescia só, malcuidado e desprezado. Sofria. As galinhas o bicavam a todo instante, os perus o perseguiam com ar ameaçador e até a empregada, que diariamente levava comida aos bichos, só pensava em enxotá-lo.
   Um dia, desesperado, o patinho feio fugiu. Queria ficar longe de todos que o perseguiam.
   Caminhou, caminhou e chegou perto de um grande brejo, onde viviam alguns marrecos. Foi recebido com indiferença: ninguém ligou para ele. Mas não foi maltratado nem ridicularizado; para ele, que até agora só sofrera, isso já era o suficiente.
   Infelizmente, a fase tranqüila não durou muito. Numa certa madrugada, a quietude do brejo foi interrompida por um tumulto e vários disparos: tinham chegado os caçadores!
Muitos marrequinhos perderam a vida. Por um milagre, o patinho feio conseguiu se salvar, escondendo-se no meio da mata.
   Depois disso, o brejo já não oferecia segurança; por isso, assim que cessaram os disparos, o patinho fugiu de lá.
   Novamente caminhou, caminhou, procurando um lugar onde não sofresse.
   Ao entardecer chegou a uma cabana. A porta estava entreaberta, e ele conseguiu entrar sem ser notado. Lá dentro, cansado e tremendo de frio, se encolheu num cantinho e logo dormiu.
   Na cabana morava uma velha, em companhia de um gato, especialista em caçar ratos, e de uma galinha, que todos os dias botava o seu ovinho.
   Na manhã seguinte, quando a dona da cabana viu o patinho dormindo no canto, ficou toda contente.
   — Talvez seja uma patinha. Se for, cedo ou tarde botará ovos, e eu poderei preparar cremes, pudins e tortas, pois terei mais ovos. Estou com muita sorte!
   Mas o tempo passava, e nenhum ovo aparecia. A velha começou a perder a paciência. A galinha e o gato, que desde o começo não viam com bons olhos recém-chegado, foram ficando agressivos e briguentos.
   Mais uma vez, o coitadinho preferiu deixar a segurança da cabana e se aventurar pelo mundo.
   Caminhou, caminhou e achou um lugar tranqüilo perto de uma lagoa, onde parou.
   Enquanto durou a boa estação, o verão, as coisas não foram muito mal. O patinho passava boa parte do tempo dentro da água e lá mesmo encontrava alimento suficiente.
   Mas chegou o outono. As folhas começaram a cair, bailando no ar e pousando no chão, formando um grande tapete amarelo. O céu se cobriu de nuvens ameaçadoras e o vento esfriava cada vez mais.
   Sozinho, triste e esfomeado, o patinho pensava, preocupado, no inverno que se aproximava.
   Num final de tarde, viu surgir entre os arbustos um bando de grandes e lindíssimas aves.  Tinham as plumas alvas, as asas grandes e um longo pescoço, delicado e sinuoso: eram cisnes, emigrando na direção de regiões quentes. Lançando estranhos sons, bateram as asas e levantaram vôo, bem alto.
   O patinho ficou encantado, olhando a revoada, até que ela desaparecesse no horizonte. Sentiu uma grande tristeza, como se tivesse perdido amigos muito queridos.
   Com o coração apertado, lançou-se na lagoa e nadou durante longo tempo. Não conseguia tirar o pensamento daquelas maravilhosas criaturas, graciosas e elegantes.
   Foi se sentindo mais feio, mais sozinho e mais infeliz do que nunca.
   Naquele ano, o inverno chegou cedo e foi muito rigoroso.
   O patinho feio precisava nadar ininterruptamente, para que a água não congelasse em volta de seu corpo, criando uma armadilha mortal. Mas era uma luta contínua e sem esperança.
   Um dia, exausto, permaneceu imóvel por tempo suficiente para ficar com as patas presas no gelo.
   — Agora morrerei — pensou. — Assim, terá fim todo meu sofrimento.
   Fechou os olhos, e o último pensamento que teve antes de cair num sono parecido com a morte foi para as grandes aves brancas.
   Na manhã seguinte, bem cedo, um camponês que passava por aqueles lados viu o pobre patinho, já meio morto de frio.
   Quebrou o gelo com um pedaço de pau, libertou o pobrezinho e levou-o para sua casa.
   Lá o patinho foi alimentado e aquecido, recuperando um pouco de suas forças. Logo que deu sinais de vida, os filhos do camponês se animaram:
   — Vamos fazê-lo voar!
   — Vamos escondê-lo em algum lugar!
  E seguravam o patinho, apertavam-no, esfregavam-no. Os meninos não tinham más intenções; mas o patinho, acostumado a ser maltratado, atormentado e ofendido, se assustou e tentou fugir. Fuga atrapalhada!
   Caiu de cabeça num balde cheio de leite e, esperneando para sair, derrubou tudo. A mulher do camponês começou a gritar, e o pobre patinho se assustou ainda mais.
   Acabou se enfiando no balde da manteiga, engordurando-se até os olhos e, finalmente se enfiou num saco de farinha, levantando uma poeira sem fim. br> A cozinha parecia um campo de batalha. Fora de si, a mulher do camponês pegara a vassoura e procurava golpear o patinho. As crianças corriam atrás do coitadinho, divertindo-se muito.
   Meio cego pela farinha, molhado de leite e engordurado de manteiga, esbarrando aqui e ali, o pobrezinho por sorte conseguiu afinal encontrar a porta e fugir, escapando da curiosidade das crianças e da fúria da mulher.
   Ora esvoaçando, ora se arrastando na neve, ele se afastou da casa do camponês e somente parou quando lhe faltaram as forças.
   Nos meses seguintes, o patinho viveu num lago, se abrigando do gelo onde encontrava relva seca.
   Finalmente, a primavera derrotou o inverno. Lá no alto, voavam muitas aves. Um dia, observando-as, o patinho sentiu um inexplicável e incontrolável desejo de voar.
   Abriu as asas, que tinham ficado grandes e robustas, e pairou no ar. Voou. Voou. Voou longamente, até que avistou um imenso jardim repleto de flores e de árvores; do meio das árvores saíram três aves brancas.
   O patinho reconheceu as lindas aves que já vira antes, e se sentiu invadir por uma emoção estranha, como se fosse um grande amor por elas.
   — Quero me aproximar dessas esplêndidas criaturas — murmurou. — Talvez me humilhem e me matem a bicadas, mas não importa. É melhor morrer perto delas do que continuar vivendo atormentado por todos.
   Com um leve toque das asas, abaixou-se até o pequeno lago e pousou tranqüilamente na água.
   — Podem matar-me, se quiserem — disse, resignado, o infeliz.
   E abaixou a cabeça, aguardando a morte. Ao fazer isso, viu a própria imagem refletida na água, e seu coração entristecido deu um pulo. O que via não era a criatura desengonçada, cinzenta e sem graça de outrora. Enxergava as penas brancas, as grandes asas e um pescoço longo e sinuoso.
   Ele era um cisne! Um cisne, como as aves que tanto admirava.
   — Bem-vindo entre nós! — disseram-lhe os três cisnes, curvando os pescoços, em sinal de saudação.
   Aquele que num tempo distante tinha sido um patinho feio, humilhado, desprezado e atormentado se sentia agora tão feliz que se perguntava se não era um sonho!
Mas, não! Não estava sonhando. Nadava em companhia de outros, com o coração cheio de felicidade.
   Mais tarde, chegaram ao jardim três meninos, para dar comida aos cisnes.
   O menorzinho disse, surpreso:
   — Tem um cisne novo! E é o mais belo de todos! E correu para chamar os pais.
   — É mesmo uma esplêndida criatura! — disseram os pais.
   E jogaram pedacinhos de biscoito e de bolo. Tímido diante de tantos elogios, o cisne escondeu a cabeça embaixo da asa.
   Talvez um outro, em seu lugar, tivesse ficado envaidecido. Mas não ele. Seu coração era muito bom, e ele sofrera muito, antes de alcançar a sonhada felicidade.

O Patinho feio

Estava analisando a história do Patinho Feio, pois irei trabalhá-la com meus alunos do 6º ano e não tive como não comentar essa experiência. Há muito tempo li esta história. E nooooossa! Como as leituras mudam... E como a maturidade, bem construída, é importante...
Na verdade eu nunca entendi como o ovo diferente foi parar num ninho de uma pata. E comecei a pensar se tal situação acontecesse comigo. Opa... A gente nunca acha isso, não é? 
Resumindo "a Mãe Pata encontrou um estranho ovo no meio dos seus ovos, e dele sai um patinho muito feio. O Patinho Feio depressa descobre que desafia a rígida estrutura social que rege a quinta apenas por ser diferente. Quando a perseguição se torna mais agressiva ele sabe que tem de ir à sua vida, e passa por um cruel teste de sobrevivência, sozinho no Inverno rigoroso e num mundo cheio de perigos. Mas finalmente ele encontra a sua verdadeira família..."
Relendo a história senti necessidade de ler a biografia do autor, quando li no sítio da Wikipedia, http://pt.wikipedia.org/wiki/Hans_Christian_Andersen, que sua ascendência poderia ser indeterminada. Ele poderia ser um filho não reconhecido da realeza dinamarquesa. Hans Christian Andersen tem uma história de rejeição materna, após a morte do pai, e o texto é considerado por alguns estudiosos como uma autobiografia.
Fazendo uma releitura do texto acabei me apaixonando pela história que traz para nós um tema tão atual: o respeito às diferenças.
Impressionante!